O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou ofício nesta terça-feira (18), à prefeitura e à secretaria de Educação de Santarém, oeste do Pará, com recomendação para que não seja adotada qualquer medida administrativa que altere a política municipal de educação escolar indígena sem consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas interessados.

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O MPF também alerta para a necessidade de manutenção dos contratos temporários dos professores indígenas enquanto não for realizado concurso público específico para as escolas indígenas.

O concurso deve ser construído com a participação dos povos indígenas e deve prever ações afirmativas, para evitar a descontinuidade do serviço público e garantir o caráter diferenciado e intercultural da educação escolar indígena, registra o MPF.

Assinada pelo procurador da República Gustavo Kenner Alcântara, a recomendação foi enviada ao prefeito, Nélio Aguiar, e à secretária de Educação, Mara Regina Xavier Belo. Assim que receberem o documento, os gestores terão prazo de dez dias para cumprir a recomendação e informar o MPF sobre as medidas adotadas.

As recomendações são instrumentos do Ministério Público que servem para alertar agentes públicos sobre a necessidade de providências para resolver uma situação irregular ou que possa levar a alguma irregularidade. Se uma recomendação não for acatada por quem deve prevenir ou resolver o problema, o Ministério Público pode tomar outras providências extrajudiciais ou judiciais.

Entenda o caso – No último dia 13 o MPF em Santarém recebeu denúncia de indígenas sobre possível rescisão contratual em massa de professores temporários contratados pela secretaria municipal de Educação de Santarém para atender quarenta e sete escolas indígenas.

Segundo as informações obtidas pelo MPF, a rescisão contratual em massa está prevista para ser realizada durante o ano letivo, e não está programado concurso público específico para as escolas indígenas.

Caso a rescisão contratual em massa ocorra sem que professores indígenas tenham sido selecionados por concurso público, os alunos podem ficar sem aulas, e também há o risco de que professores não indígenas sejam lotados em escolas indígenas. Ambas as situações violam os direitos indígenas.

Na recomendação o procurador da República cita trechos da Constituição, da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da Resolução da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação nº 03/99, da lei 9.394/96, do Decreto 6.861/2009, e do Plano Nacional de Educação (lei nº 13.005/2014).

Esses dispositivos legais estabelecem uma série de medidas para preservar os direitos indígenas, com destaque para a importância de que as políticas e programas educacionais sejam construídos com os povos interessados e que respeitem sua identidade social e cultural, os seus costumes, língua e tradições, e que seja prevista a participação da comunidade nas suas formas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de ensino-aprendizagem.

Riscos – Na recomendação, o MPF alerta que eventual remoção de professores lotados em escolas urbanas ou rurais não indígenas para as escolas indígenas prejudicará a qualidade do ensino ofertado, tendo em vista que esses profissionais não foram selecionados a partir de competências específicas para atuar nas unidades escolares indígenas, desrespeitando a legislação especializada que garante o caráter diferenciado da educação escolar indígena.

Para o MPF, eventual remoção também elimina a possibilidade de os próprios professores indígenas serem selecionados para o exercício do magistério nas escolas indígenas.

Ainda que o município de Santarém vislumbre a realização de concurso público específico e diferenciado para as escolas indígenas, deve ser garantida a transição de modo a não prejudicar o serviço público ofertado, tanto em termos de continuidade quanto de qualidade da educação diferenciada, destaca o procurador da República Gustavo Kenner Alcântara.

“A remoção também pode implicar em diversos outros problemas, tais como ausência de contato com professores da própria etnia, dificuldades de relacionamento entre professores e indígenas, desrespeito às práticas tradicionais dos indígenas, déficit de aprendizado e alto índice de desistência ou falta de professores, em razão dos locais de oferecimento de aulas muitas vezes distante de suas residências”, alerta.

A mudança na forma de contratação, nesse caso, teria reflexos diretos na própria natureza do serviço público ofertado, diante da possibilidade concreta de demissão de professores indígenas que seriam substituídos por professores não indígenas, registra o MPF.

Com informações da assessoria de comunicação Ministério Público Federal no Pará.

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